Valentiniano II (375 – 392) O Último Imperador-Criança
O Último Imperador-Criança: A Trágica Saga de Valentiniano II
Um Império em Fragmentos
No crepúsculo do Império Romano do Ocidente, quando as fronteiras se desfaziam e a autoridade imperial se diluía entre generais ambiciosos e bispos intransigentes, surgiu uma figura improvável: Valentiniano II. Proclamado imperador aos quatro anos de idade, ele não empunhou a espada nem ditou leis com punho firme. Foi, antes, um símbolo — e, talvez, uma vítima — de um mundo em colapso.
A Coroa de um Menino
Valentiniano II nasceu em 371 d.C., filho do imperador Valentiniano I e de sua segunda esposa, Justina. Quando seu pai morreu repentinamente em 375, o pequeno Valentiniano foi alçado ao trono ocidental. A nomeação não foi um gesto de confiança em sua capacidade, mas uma jogada política para preservar a dinastia Valentiniana e evitar que o exército se fragmentasse em disputas internas.
Enquanto o menino imperador era coroado, o verdadeiro poder recaía sobre seu meio-irmão Graciano e, no Oriente, sobre o enérgico Teodósio I. Valentiniano era imperador apenas no nome — uma peça no tabuleiro de xadrez imperial.
Intrigas, Usurpadores e Exílios
O cenário político da época era um campo minado. Em 383, Graciano foi assassinado por tropas leais ao usurpador Magno Máximo, que rapidamente tomou o controle da Gália, Hispânia e Britânia. Valentiniano II, então com apenas 12 anos, fugiu com sua mãe para Milão, buscando proteção sob as asas de Teodósio.
Cinco anos depois, em 388, Teodósio derrotou Magno Máximo e restaurou Valentiniano ao trono ocidental. Mas o preço foi alto: o jovem imperador passou a viver sob a sombra do imperador oriental, vigiado de perto e com sua autoridade cada vez mais esvaziada.
A Guerra das Crenças
Se o poder político lhe escapava, o religioso também não lhe pertencia. Valentiniano II foi lançado no olho do furacão das disputas teológicas entre cristãos nicenos (ortodoxos) e arianos. Sua mãe, Justina, era uma fervorosa ariana e tentou impor sua fé em Milão — uma cidade dominada pela figura imponente de Ambrósio, bispo e defensor intransigente da ortodoxia.
O embate entre Justina e Ambrósio foi mais do que uma disputa religiosa: foi um prenúncio da ascensão da Igreja sobre o Estado. Ambrósio não apenas se recusou a entregar igrejas aos arianos, como também desafiou diretamente o imperador. E venceu. Valentiniano, pressionado, cedeu. A Igreja saía fortalecida; o trono, enfraquecido.
O Fantoche e o General
Após a vitória sobre Magno Máximo, Teodósio nomeou o general franco Arbogasto como magister militum no Ocidente — uma espécie de tutor armado de Valentiniano II. O jovem imperador, agora com cerca de 17 anos, era uma figura decorativa. Arbogasto governava de fato, e não tardou a entrar em rota de colisão com seu pupilo.
Morte em Viena
Em 392, Valentiniano II foi encontrado morto em sua residência em Viena (atual França), enforcado. A versão oficial falava em suicídio. Mas poucos acreditaram. As suspeitas recaíram imediatamente sobre Arbogasto, que havia rompido com o imperador pouco antes. Pouco depois, o general nomearia Eugênio como novo imperador, desafiando abertamente Teodósio — e precipitando mais uma guerra civil.
O Legado de um Imperador Silencioso
Valentiniano II não deixou leis memoráveis, nem vitórias militares. Mas sua breve e turbulenta trajetória diz muito sobre o fim de uma era. Ele foi o retrato de um império em declínio: manipulado por sua mãe, dominado por generais, desafiado por bispos. Sua morte marcou o fim da dinastia Valentiniana e o início de uma nova fase de fragmentação e instabilidade no Ocidente.
Mais do que um imperador, Valentiniano foi um espelho — refletindo as tensões entre fé e poder, entre Roma e Constantinopla, entre o passado glorioso e um futuro incerto.
Epílogo
A história de Valentiniano II é, em última análise, a história de um império que já não sabia mais quem mandava. Um menino coroado para manter aparências, um jovem silenciado por forças maiores, um imperador cuja morte permanece envolta em mistério. E, talvez por isso mesmo, uma das figuras mais emblemáticas do fim da Antiguidade.
Por Albino Monteiro