Karl Dönitz: Grande Almirante e Comandante-em-Chefe da Kriegsmarine
Karl Dönitz: Grande Almirante e Comandante-em-Chefe da Kriegsmarine
Karl Dönitz (1891-1980) foi uma figura central na história naval alemã do século XX. Sua carreira abrangeu as duas Guerras Mundiais, culminando em sua ascensão a Grande Almirante e Comandante-em-Chefe da Kriegsmarine, a marinha de guerra alemã, durante a Segunda Guerra Mundial. Dönitz não foi apenas um estrategista naval brilhante, mas também o último chefe de estado do Terceiro Reich por um breve período após a morte de Adolf Hitler. Sua vida e suas decisões refletem as complexidades morais e estratégicas de um período conturbado da história.
Primeiros Anos e Início da Carreira Naval
Nascido em Grünau, perto de Berlim, em 16 de setembro de 1891, Karl Dönitz ingressou na Kaiserliche Marine (Marinha Imperial Alemã) em 1910. Ele serviu em torpedeiros e, no início da Primeira Guerra Mundial, transferiu-se para a força de submarinos, um ramo que moldaria profundamente sua futura doutrina de guerra. Durante a Grande Guerra, Dönitz comandou o submarino U-68 e foi capturado pelos britânicos em 1918. Sua experiência como prisioneiro de guerra proporcionou-lhe um tempo para refletir sobre as táticas navais e o potencial dos submarinos, que ele via como a arma decisiva em futuras guerras navais.
O Período Entre Guerras e o Desenvolvimento da "Guerra Total de U-Boat"
Após a Primeira Guerra Mundial, com as restrições impostas à marinha alemã pelo Tratado de Versalhes, Dönitz desempenhou um papel crucial na reconstrução clandestina da força de submarinos. Nomeado chefe da flotilha de U-Boats em 1935, ele dedicou-se ao desenvolvimento da tática que se tornaria conhecida como "matilha de lobos" (Rudeltaktik). Essa estratégia envolvia múltiplos submarinos atacando comboios aliados simultaneamente, sobrecarregando as defesas inimigas e maximizando a eficácia dos ataques. Dönitz acreditava que a chave para a vitória no Atlântico residia em um número massivo de U-Boats operando em coordenação, visando estrangular as linhas de suprimento britânicas. Ele defendia a construção de uma vasta frota de cerca de 300 U-boats para implementar essa estratégia de "guerra total de U-boat", argumentando que a interrupção do comércio marítimo britânico seria decisiva.
A Segunda Guerra Mundial: Batalha do Atlântico e Ascensão
Com o início da Segunda Guerra Mundial em setembro de 1939, Dönitz, então um Comodoro, liderou a força de submarinos alemã. A Batalha do Atlântico tornou-se a campanha naval mais longa e contínua da guerra, com os U-boats de Dönitz desempenhando um papel central. Ele supervisionou as operações, que inicialmente obtiveram grande sucesso, afundando milhões de toneladas de navios aliados e ameaçando seriamente o esforço de guerra britânico. Os períodos de maior sucesso dos U-boats foram conhecidos como os "Tempos Felizes", onde as perdas aliadas eram altíssimas.
Seu foco incansável na eficiência e na moral dos seus homens, combinada com sua fé inabalável na eficácia dos U-boats, cimentou sua reputação dentro da Kriegsmarine. Em 1943, diante das crescentes perdas e da insatisfação de Hitler com a performance dos navios de superfície, Dönitz substituiu o Grande Almirante Erich Raeder como Comandante-em-Chefe da Kriegsmarine. Esta promoção marcou o reconhecimento de sua liderança e sua visão estratégica. Sob seu comando, a Kriegsmarine concentrou seus recursos restantes na guerra de submarinos, embora a balança da guerra no Atlântico começasse a pender contra a Alemanha devido aos avanços tecnológicos aliados (como o radar e o sonar aprimorados, a decifração do código Enigma e a maior cobertura aérea). Dönitz era conhecido por sua dedicação aos seus submarinistas, a quem ele se referia como "meus meninos", e sua liderança carismática, que mantinha o moral elevado mesmo diante de perdas crescentes.
O Grande Almirante e o Colapso do Reich
À medida que a guerra progredia e a situação militar alemã se deteriorava, Dönitz permaneceu leal a Adolf Hitler, mantendo uma relação de confiança com o Führer, que via Dönitz como um dos poucos que realmente entendiam a importância da guerra submarina. Em seu testamento político, Hitler designou Dönitz como seu sucessor, Presidente do Reich e Comandante Supremo das Forças Armadas, uma decisão que surpreendeu muitos, dada a sua relativa falta de experiência política e sua dedicação quase exclusiva à marinha.
Após o suicídio de Hitler em 30 de abril de 1945, Dönitz assumiu a liderança de um governo que controlava apenas uma pequena porção do território alemão e tinha como principal objetivo negociar uma rendição que permitisse o maior número possível de tropas e civis alemães serem resgatados da frente oriental e capturados pelas forças ocidentais, evitando assim a captura pelos soviéticos.
Seu breve governo, conhecido como Governo de Flensburg, tentou organizar uma rendição faseada, mas os Aliados insistiram em uma rendição incondicional. Em 7 de maio de 1945, Dönitz autorizou o General Alfred Jodl a assinar o Instrumento de Rendição Incondicional, efetivamente encerrando a Segunda Guerra Mundial na Europa. Em 23 de maio de 1945, Dönitz e os membros de seu governo foram presos pelos Aliados, e o governo de Flensburg foi dissolvido.
O Julgamento de Nuremberg e o Legado
Karl Dönitz foi um dos principais réus nos Julgamentos de Nuremberg por crimes de guerra. Ele foi acusado de conspiração para cometer crimes contra a paz, planejar e iniciar uma guerra de agressão, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Embora tenha sido absolvido das acusações de crimes contra a humanidade, foi considerado culpado de planejar e iniciar uma guerra de agressão e de crimes de guerra relacionados à condução da guerra submarina. Um ponto chave foi a "Ordem Lacônia" de 1942, que, embora justificada por Dönitz como uma medida de segurança após o ataque a um U-boat envolvido em operações de resgate, foi interpretada como uma ordem para não resgatar sobreviventes de navios afundados, o que era uma violação das leis de guerra. A defesa argumentou que ordens similares foram emitidas por outros beligerantes, e o Almirante Chester Nimitz da Marinha dos EUA forneceu um depoimento em apoio à defesa de Dönitz em relação à natureza irrestrita da guerra submarina. Ele foi condenado a dez anos de prisão, cumpridos na Prisão de Spandau.
Após sua libertação em 1956, Dönitz publicou suas memórias, "Dez Anos e Vinte Dias" (Zehn Jahre und Zwanzig Tage), nas quais defendia suas ações e as da Kriegsmarine. Seu legado continua a ser debatido por historiadores. Ele é reconhecido como um líder naval inovador e eficaz que conseguiu extrair o máximo de sua força de submarinos, mas também como uma figura que serviu fielmente a um regime genocida e que, embora não diretamente envolvido nos crimes do Holocausto, aceitou e apoiou a ideologia nazista em diversas ocasiões. A questão de sua cumplicidade com os crimes do regime nazista e sua responsabilidade na condução de uma guerra total permanece um ponto de discussão. No entanto, sua importância para a estratégia naval e sua influência na Batalha do Atlântico são inegáveis, e sua capacidade de liderar e inspirar seus homens é frequentemente destacada.