Johannes Blaskowitz (1883-1948)
Johannes Blaskowitz (1883-1948): Um General Alemão entre a Lealdade e a Consciência
Johannes Blaskowitz foi uma figura complexa e, por vezes, contraditória, dentro do Alto Comando Alemão durante a Segunda Guerra Mundial. Nascido em 10 de julho de 1883, em Weissentin, Prússia Ocidental (hoje Wiślinka, Polônia), Blaskowitz trilhou uma carreira militar que o levou de um oficial prussiano leal a um general que, embora comprometido com seu dever, expressou preocupações morais significativas sobre as atrocidades nazistas. Sua história é um estudo de caso fascinante sobre os dilemas enfrentados por muitos militares profissionais em um regime totalitário.
Primeiros Anos e Carreira Militar Pré-Guerra
Blaskowitz ingressou no Exército Prussiano em 1901 e serviu na Primeira Guerra Mundial, alcançando a patente de capitão. Sua participação no conflito lhe rendeu a Cruz de Ferro, um testemunho de sua bravura e competência no campo de batalha. Após a guerra, ele continuou sua carreira no Reichswehr, o pequeno exército permitido à Alemanha pelo Tratado de Versalhes. Durante a República de Weimar, Blaskowitz construiu uma reputação de oficial competente, disciplinado e apolítico, características que eram valorizadas em um exército que buscava se reconstruir e manter a profissionalidade em um cenário político turbulento.
Com a ascensão de Adolf Hitler e do Partido Nazista ao poder em 1933, muitos oficiais do Reichswehr se viram em uma encruzilhada. Blaskowitz, como a maioria de seus pares, permaneceu fiel ao seu juramento de lealdade ao Estado, mesmo quando o regime nazista começou a se consolidar e a mostrar suas tendências expansionistas e repressivas. Ele foi promovido a general e comandou várias unidades durante a preparação para a guerra, incluindo a 2ª Divisão de Infantaria e, posteriormente, o XIII Corpo de Exército.
A Campanha da Polônia e o Confronto com as SS
O ponto de virada na carreira e na consciência de Blaskowitz ocorreu durante a invasão da Polônia em setembro de 1939. Como comandante do 8º Exército, ele teve um papel crucial no sucesso da campanha. No entanto, foi também na Polônia que Blaskowitz se deparou pela primeira vez com a brutalidade sistemática das SS (Schutzstaffel) e de outras unidades de segurança nazistas contra a população civil e, em particular, contra os judeus.
Horrorizado com os massacres, pilhagens e execuções sumárias perpetradas pelos Einsatzgruppen (grupos de extermínio), Blaskowitz, um católico devoto e um oficial com forte senso de honra militar, redigiu uma série de memorandos e relatórios a seus superiores, incluindo o Comandante-em-Chefe do Exército, Walther von Brauchitsch, e até mesmo ao próprio Hitler, protestando veementemente contra essas atrocidades. Ele argumentou que tais atos desmoralizavam as tropas, violavam as leis de guerra e manchavam a honra da Wehrmacht.
Em um de seus memorandos mais notórios, datado de 6 de fevereiro de 1940, Blaskowitz condenou explicitamente o "comportamento selvagem e desumano" dos soldados das SS e da polícia na Polônia, descrevendo-o como "vergonhoso" e "humilhante para o exército". Ele alertou que essas ações poderiam levar à "desmoralização moral" das tropas e a uma "deterioração gradual da disciplina".
Esses protestos, no entanto, caíram em ouvidos moucos. Hitler, furioso com as críticas de Blaskowitz, chamou-o de "um católico reacionário" e o afastou do comando ativo na frente oriental, transferindo-o para cargos de comando na França, que eram considerados menos "importantes" do ponto de vista operacional. Embora Blaskowitz tenha sido condecorado com a Cruz de Cavaleiro da Cruz de Ferro por sua atuação na Polônia, suas objeções morais essencialmente encerraram sua ascensão no Alto Comando.
Comandos Posteriores e a Resistência
Apesar de ter sido marginalizado por seus protestos, Blaskowitz continuou a servir o Reich, comandando unidades na França ocupada. Ele supervisionou a construção das defesas do Muro do Atlântico e, após o Dia D, liderou o Grupo de Exércitos G no sul da França. Durante a retirada alemã da França, ele conseguiu coordenar uma retirada relativamente ordenada, minimizando as perdas e mostrando sua competência tática.
Embora não tenha se envolvido ativamente em nenhuma conspiração para derrubar Hitler, como a de 20 de julho de 1944, Blaskowitz era conhecido por seus colegas por suas visões críticas ao regime e por seu desprezo pelas SS. Há relatos de que ele nutria simpatia pela resistência militar alemã, e sua postura ética o diferenciava de muitos outros generais que optaram por fechar os olhos às atrocidades nazistas.
Nos estágios finais da guerra, Blaskowitz comandou o Grupo de Exércitos H na Holanda, onde se encontrou em uma situação cada vez mais desesperadora. Ele demonstrou novamente seu profissionalismo ao negociar a rendição das tropas alemãs na Holanda, evitando mais derramamento de sangue e sofrimento para a população civil.
O Pós-Guerra e a Morte
Após a rendição incondicional da Alemanha em maio de 1945, Johannes Blaskowitz foi preso pelos Aliados e levado a julgamento pelos crimes de guerra no Processo do Alto Comando, um dos julgamentos subsequentes de Nuremberg. Ironicamente, Blaskowitz foi acusado de crimes que ele mesmo havia denunciado durante a guerra, embora as acusações estivessem mais ligadas à sua responsabilidade de comando em áreas onde ocorreram atrocidades, e não por ele as ter ordenado ou apoiado.
Em 5 de fevereiro de 1948, antes que seu julgamento pudesse ser concluído, Johannes Blaskowitz cometeu suicídio na prisão de Nuremberg, atirando-se do terceiro andar. As circunstâncias exatas de sua morte permanecem objeto de especulação, mas muitos acreditam que ele não suportou a desonra de ser julgado por crimes que ele se esforçou para combater e denunciar.
Legado e Reavaliação Histórica
Johannes Blaskowitz é uma figura que desafia a categorização simples. Ele não foi um herói da resistência no sentido mais puro, nem um vilão cúmplice das atrocidades nazistas. Em vez disso, ele representou um tipo de general alemão que tentou manter um código de ética militar em face de um regime que desmantelava sistematicamente esses valores.
Seus protestos na Polônia são um testemunho de sua consciência individual e de sua recusa em aceitar a barbárie. Embora esses protestos não tenham tido o impacto desejado na época e tenham custado a ele uma maior ascensão na hierarquia militar, eles servem como um lembrete importante de que nem todos os membros da Wehrmacht foram cúmplices passivos dos crimes nazistas.
A história de Johannes Blaskowitz oferece uma lente valiosa para entender as complexidades morais e os dilemas enfrentados por aqueles que serviram em exércitos totalitários. Ele é um lembrete de que, mesmo nas circunstâncias mais terríveis, a voz da consciência individual pode, e por vezes deve, ser ouvida. Sua trajetória continua a ser objeto de estudo e debate, contribuindo para uma compreensão mais matizada da Segunda Guerra Mundial e do comportamento humano em tempos de extrema adversidade.