Batalha de Iwo Jima ( 19 de fevereiro a 26 de março de 1945 )
A Batalha de Iwo Jima: Um Estudo Abrangente sobre Sacrifício e Conquista no Pacífico
A Batalha de Iwo Jima, travada de 19 de fevereiro a 26 de março de 1945, permanece como um dos conflitos mais brutais e emblemáticos da Guerra do Pacífico durante a Segunda Guerra Mundial. Sua ferocidade, o elevado número de baixas e o simbolismo de sua conquista a tornam um ponto central na historiografia militar. Esta monografia explora detalhadamente os aspectos cruciais da batalha, desde seus antecedentes estratégicos até suas consequências duradouras, visando fornecer uma compreensão completa de sua significância.
Antecedentes Estratégicos e a Importância de Iwo Jima
No início de 1945, as forças aliadas, lideradas pelos Estados Unidos, estavam avançando implacavelmente em direção ao Japão. A estratégia de "salto de ilhas" (island hopping) havia se mostrado eficaz, mas a distância entre as bases aliadas e o Japão continental ainda representava um desafio logístico e tático. É nesse contexto que Iwo Jima, uma pequena ilha vulcânica a aproximadamente 1.200 km da costa japonesa, assume uma importância estratégica ímpar.
Localização Geográfica e Valor Tático
Iwo Jima, cujo nome significa "Ilha do Enxofre", era pequena, com apenas cerca de 8 km de comprimento e 4 km de largura. No entanto, sua localização geográfica a tornava vital. A ilha possuía três campos de pouso em potencial: dois já estavam construídos e operacionais, e um terceiro estava em construção. Esses aeródromos eram cruciais por várias razões:
Apoio a Bombardeiros B-29: Os bombardeiros B-29 Superfortress americanos, que realizavam missões de longo alcance contra o Japão, enfrentavam viagens exaustivas, consumindo muito combustível e tornando-se vulneráveis. Iwo Jima poderia servir como uma base de pouso de emergência para aviões danificados, um ponto de reabastecimento para prolongar o tempo de patrulha sobre o Japão e uma base para caças de escolta.
Neutralização de Ataques Japoneses: A partir de Iwo Jima, os japoneses lançavam ataques aéreos contra as formações de B-29 que se dirigiam ao Japão e alertavam sobre a aproximação dos bombardeiros, permitindo a preparação de defesas. Conquistar a ilha eliminaria essa ameaça e esse sistema de alerta.
Base para Operações Futuras: A tomada de Iwo Jima abriria caminho para futuras operações anfíbias contra Okinawa e, finalmente, o próprio Japão.
A Defesa Japonesa: Um Modelo de Resistência
O comando japonês, sob a liderança do General Tadamichi Kuribayashi, compreendia a importância vital de Iwo Jima e decidiu transformá-la em uma fortaleza impenetrável. Kuribayashi, um estrategista brilhante e realista, sabia que a vitória japonesa era improvável, mas estava determinado a infligir o maior número possível de baixas aos americanos, retardando seu avanço e desmoralizando-os.
Ao contrário da doutrina japonesa anterior de enfrentar o inimigo nas praias, Kuribayashi desenvolveu uma estratégia defensiva inovadora:
Defesa em Profundidade: Em vez de combater na praia, as forças japonesas se entrincheiraram em uma vasta rede de túneis, cavernas interligadas, bunkers fortificados e posições de artilharia bem camufladas. O Monte Suribachi, no extremo sul da ilha, era uma fortaleza natural, repleta de túneis e posições de metralhadora.
Fortificações Subterrâneas: Os defensores construíram mais de 18 quilômetros de túneis subterrâneos, alguns a até 15 metros de profundidade, capazes de suportar bombardeios pesados. Isso permitia que as tropas se movessem entre as posições com relativa segurança e lançassem ataques surpresa.
Ausência de Banzai Charges: Kuribayashi proibiu os tradicionais ataques banzai suicidas, que haviam custado muitas vidas japonesas em batalhas anteriores sem ganhos significativos. Sua ordem era lutar até o último homem, mas de forma tática e organizada, infligindo o máximo de danos ao inimigo.
Camuflagem e Fogo Cruzado: As posições japonesas eram meticulosamente camufladas, tornando-as extremamente difíceis de localizar. As armas estavam posicionadas para criar campos de fogo cruzado devastadores, cobrindo cada centímetro da ilha.
Cerca de 21.000 defensores japoneses foram posicionados em Iwo Jima, armados com artilharia pesada, morteiros, metralhadoras e granadas. Eles estavam preparados para lutar até a morte.
A Invasão: "Inferno na Terra"
A invasão de Iwo Jima, codinome Operação Destacamento, foi atribuída ao Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (USMC). A força de ataque consistia na III Força Anfíbia, compreendendo a 3ª, 4ª e 5ª Divisões de Fuzileiros Navais.
Bombardeio Pré-Invasão
Antes do desembarque, Iwo Jima foi submetida a um intenso bombardeio naval e aéreo, que durou três dias. No entanto, devido à natureza vulcânica do solo, que absorvia as explosões, e à profundidade das fortificações japonesas, o bombardeio teve um efeito limitado na capacidade defensiva do inimigo. Muitos dos bunkers e túneis subterrâneos permaneceram intactos.
O Desembarque (19 de Fevereiro de 1945 - "D-Day")
No dia 19 de fevereiro de 1945, às 09h00, a primeira onda de fuzileiros navais desembarcou nas praias sudeste de Iwo Jima. As praias de areia vulcânica preta, macia e íngreme, dificultavam o avanço e a movimentação de veículos.
Inicialmente, a resistência japonesa foi surpreendentemente fraca. Isso se devia à estratégia de Kuribayashi de permitir que os fuzileiros navais avançassem para o interior da ilha antes de liberar o fogo. Assim que um número significativo de tropas americanas estava nas praias, os japoneses abriram fogo com um volume e precisão devastadores. Metralhadoras, morteiros e artilharia naval, disparando de posições ocultas no Monte Suribachi e em todo o interior, transformaram as praias em um matadouro.
O avanço foi lento e custoso. Cada metro quadrado de terreno tinha que ser conquistado através de combates brutais, muitas vezes corpo a corpo, contra um inimigo entrincheirado e invisível. A ausência de uma "linha de frente" clara, com os japoneses surgindo de túneis e bunkers atrás das linhas americanas, adicionava à confusão e ao perigo.
A Tomada do Monte Suribachi
A conquista do Monte Suribachi, o pico de 169 metros que dominava as praias do sul da ilha, foi um objetivo prioritário. Sua posse era essencial para eliminar a ameaça da artilharia e dos observadores japoneses que controlavam a área de desembarque.
No quarto dia da batalha, 23 de fevereiro de 1945, um pequeno grupo de fuzileiros navais da Companhia E, 2º Batalhão, 28º Regimento da 5ª Divisão, liderado pelo Capitão Dave Severance, conseguiu chegar ao cume do Suribachi e hastear uma pequena bandeira americana. Essa primeira bandeira, embora um momento de vitória, não era grande o suficiente para ser vista claramente das praias.
Horas depois, uma segunda, e maior, bandeira foi hasteada no Suribachi por um grupo de seis fuzileiros navais: Harlon Block, Rene Gagnon, Ira Hayes, Mike Strank, Franklin Sousley e John Bradley (um enfermeiro da Marinha). O fotógrafo Joe Rosenthal da Associated Press capturou esse momento icônico em uma fotografia que se tornaria uma das imagens mais famosas e poderosas da Segunda Guerra Mundial. A imagem da segunda hasteamento da bandeira em Iwo Jima tornou-se um símbolo de coragem, sacrifício e vitória para os Estados Unidos, embora a batalha estivesse longe de terminar.
O Combate no Norte da Ilha: Uma Carnificina Prolongada
A queda do Suribachi marcou um avanço psicológico significativo, mas a parte norte da ilha, onde os campos de pouso estavam localizados e as defesas japonesas eram ainda mais elaboradas, se revelou um inferno ainda maior. O terreno era irregular, com cristas, vales e desfiladeiros repletos de fortificações.
O combate no norte foi caracterizado por:
Guerra de Atrito: Os fuzileiros navais enfrentaram uma resistência fanaticamente determinada, com os japoneses lutando até a morte de cada posição. Cada bunker, cada caverna, cada túnel tinha que ser limpo individualmente, muitas vezes com granadas de fósforo branco, lança-chamas e cargas de demolição.
Baixas Elevadas: As baixas americanas dispararam. O avanço era medido em metros por dia, e cada metro era pago com vidas. As companhias eram dizimadas, e os fuzileiros navais operavam sob constante fogo inimigo e privação extrema.
Fadiga de Combate: A natureza incessante e brutal da luta causou um enorme desgaste psicológico e físico nas tropas. A falta de sono, a alimentação precária e o constante perigo levaram muitos ao limite.
Suprimentos e Evacuação: A dificuldade do terreno e o fogo inimigo contínuo dificultavam o transporte de suprimentos para a linha de frente e a evacuação de feridos.
Um dos pontos mais sangrentos da batalha foi a tomada do "Bloody Gorge" (Garganta Sangrenta) e da "Meat Grinder" (Moedor de Carne), áreas onde os japoneses haviam concentrado uma defesa formidável. Nesses locais, o combate se tornou uma luta desesperada, com baixas massivas em ambos os lados.
O Fim da Resistência Japonesa
À medida que a batalha se estendia, as forças japonesas em Iwo Jima ficavam sem suprimentos e eram sistematicamente aniquiladas. O General Kuribayashi e seus homens continuaram a lutar com uma bravura e determinação incomuns, muitas vezes lançando ataques noturnos suicidas.
Em 26 de março de 1945, após 36 dias de combate ininterrupto, Iwo Jima foi declarada segura pelos americanos. No entanto, pequenos bolsões de resistência japonesa continuaram a emergir de túneis e cavernas por semanas após a declaração, e alguns até se renderam anos depois da guerra.
O General Kuribayashi acredita-se ter morrido em um dos últimos ataques suicidas ou em seu posto de comando, recusando-se a se render. Seu corpo nunca foi encontrado.
Consequências e Legado da Batalha
A Batalha de Iwo Jima foi uma vitória estratégica para os Estados Unidos, mas veio a um custo terrível.
Baixas
Estados Unidos: A batalha resultou em aproximadamente 26.000 baixas americanas, incluindo 6.821 mortos e cerca de 19.217 feridos. As baixas americanas em Iwo Jima excederam as baixas japonesas na proporção de 1:1, uma ocorrência rara na Guerra do Pacífico. Essa foi a única batalha da Marinha dos EUA na guerra onde as baixas americanas (mortos e feridos) excederam as baixas japonesas.
Japão: Das aproximadamente 21.000 tropas japonesas que defenderam Iwo Jima, apenas cerca de 1.083 foram feitas prisioneiras, muitas delas feridas. Praticamente todos os outros defensores morreram em combate.
Impacto Estratégico
A conquista de Iwo Jima provou ser fundamental para as operações aéreas americanas. Os campos de pouso foram rapidamente reparados e ampliados, servindo como bases de emergência vitais para os bombardeiros B-29. Estima-se que mais de 2.400 bombardeiros B-29 com problemas de motor ou danos de combate fizeram pousos de emergência em Iwo Jima, salvando assim a vida de quase 27.000 tripulantes aéreos. A ilha também se tornou uma base para caças P-51 Mustang que escoltavam os B-29 em suas missões contra o Japão, reduzindo as perdas americanas e aumentando a eficácia dos bombardeios.
Legado Simbólico e Memória
A imagem do hasteamento da bandeira no Monte Suribachi se tornou um símbolo duradouro de patriotismo, sacrifício e perseverança. Ela foi imortalizada em selos, monumentos e continua a ser uma das fotografias mais reproduzidas da história. A batalha, com sua brutalidade e o heroísmo de ambos os lados, serve como um lembrete vívido do custo da guerra.
O sacrifício dos fuzileiros navais em Iwo Jima, e a determinação fanática dos defensores japoneses, demonstraram a ferocidade da resistência japonesa e influenciaram o planejamento para a invasão do Japão continental (Operação Downfall), contribuindo indiretamente para a decisão de usar armas atômicas para forçar a rendição japonesa e evitar uma invasão terrestre ainda mais sangrenta.
Conclusão
A Batalha de Iwo Jima foi um capítulo sombrio e, ao mesmo tempo, heroico da Segunda Guerra Mundial. Ela exemplifica a brutalidade implacável do combate no Pacífico, a capacidade de resistência e engenhosidade dos defensores japoneses, e a coragem e determinação inabalável dos fuzileiros navais americanos. Mais do que uma simples conquista territorial, Iwo Jima tornou-se um símbolo de sacrifício extremo, uma prova do custo humano da guerra e um lembrete da coragem extraordinária que pode surgir nas mais terríveis circunstâncias. Seu legado continua a ecoar na história militar e na memória coletiva, um tributo aos milhares que lutaram e morreram nas areias negras e rochas vulcânicas desta pequena e estratégica ilha.