Plutão: O Senhor do Submundo e das Riquezas Subterrâneas

 

Plutão: O Senhor do Submundo e das Riquezas Subterrâneas

Na tapeçaria complexa da mitologia romana, poucas figuras são tão enigmáticas e multifacetadas quanto Plutão. Muitas vezes associado a um reino de escuridão e terror, este deus vai muito além da simples personificação da morte. Ele é o soberano de um domínio vasto, que abrange não apenas as almas dos falecidos, mas também as inestimáveis riquezas escondidas nas profundezas da terra. Prepare-se para desvendar as camadas de um dos deuses mais intrigantes do panteão romano.

Do Hades Grego ao Rico Plutão

A jornada de Plutão no panteão romano começa com uma assimilação. Ele é a contraparte romana do temido Hades grego, mas com nuances que o distinguem. O próprio nome "Plutão" é um eufemismo que os gregos usavam para o deus do submundo – "Plouton", significando "o rico" ou "o que enriquece". Essa designação não é acidental. Para os romanos, Plutão não era apenas o guardião dos mortos, mas também o detentor das fortunas minerais encontradas no subsolo.

Filho de Saturno (o Cronos grego) e Ops (a Reia grega), e irmão de Júpiter e Netuno, Plutão assumiu o domínio do mundo subterrâneo após a épica divisão do universo entre os irmãos. Sua conexão com a terra e suas riquezas – metais preciosos e pedras – lhe rendeu outro epíteto significativo: Dis Pater, o "Pai da Riqueza". Uma prova irrefutável de que, nas profundezas da escuridão, residia também a promessa da abundância.

Atributos de um Soberano Austero

A imagem de Plutão é frequentemente imponente e sombria, mas carregada de dignidade. Seus atributos são inconfundíveis:

  • Cetro ou Bastão: Símbolo incontestável de sua soberania sobre o reino dos mortos.

  • Cornucópia: Uma representação das riquezas da terra e da fertilidade que, paradoxalmente, ele controlava.

  • Capacete da Invisibilidade (Galeia de Hades): Embora mais associado a seu equivalente grego, ocasionalmente aparecia em representações romanas, permitindo-lhe mover-se sem ser detectado.

  • Cão Cérbero: O lendário cão de três cabeças, fiel guardião das portas do submundo e seu inseparável companheiro.

  • Carro puxado por cavalos negros: O meio de transporte para suas viagens entre os reinos, fundamental no mito do rapto de Prosérpina.

É crucial entender que, apesar de seu domínio sobre a morte, Plutão não era visto como uma divindade malevolente. Pelo contrário, ele era um juiz justo e imparcial, garantindo a ordem no submundo e o destino adequado das almas. Sua natureza era a de um soberano da transição e do ciclo inerente à vida e à morte, e não um arauto do mal.

O Rapto de Prosérpina: O Mito das Estações

O mito mais central e comovente ligado a Plutão é, sem dúvida, o Rapto de Prosérpina (a Perséfone grega). Movido por um amor arrebatador, Plutão a raptou enquanto ela colhia flores. O desespero de Ceres, mãe de Prosérpina e deusa da agricultura, lançou o mundo em um luto profundo e uma infertilidade avassaladora.

Júpiter, intervindo para salvar a Terra da ruína, mediou um acordo: Prosérpina passaria uma parte do ano com Plutão no submundo e a outra parte com sua mãe na superfície. Este mito não é apenas uma história trágica de amor e perda; é a explicação etiológica para as estações do ano. O período de Prosérpina no submundo corresponde ao outono e inverno, estações de esterilidade, e seu retorno à superfície marca a primavera e o verão, épocas de vida e abundância. Uma dualidade que reforça a complexidade de Plutão como senhor da morte e, simultaneamente, figura essencial para o ciclo da vida.

Culto e Veneração: Um Respeito Reverencial

O culto a Plutão na Roma Antiga diferia das celebrações ostensivas dedicadas a outras divindades. Suas cerimônias eram mais discretas, frequentemente realizadas à noite, em locais subterrâneos ou santuários específicos. Sacrifícios de animais de pelo escuro, como touros negros, eram comuns, e libações derramadas na terra simbolizavam a conexão com seu domínio subterrâneo.

Os romanos nutriam um respeito reverencial por Plutão, muitas vezes evitando pronunciar seu nome diretamente, preferindo eufemismos como Dis Pater ou Orcus. Sua imagem era menos proeminente em templos grandiosos e mais em altares domésticos ou locais de sepultamento, sublinhando sua associação com o luto e a memória dos falecidos.

Os Ludi Tarentini (Jogos Tarentinos), realizados a cada século, eram um dos poucos eventos públicos em que Plutão e Prosérpina eram homenageados em conjunto com outras divindades do submundo, buscando propiciar essas divindades e garantir a prosperidade contínua do império.

Plutão na Arte e Literatura: Imagens Duradouras

A presença de Plutão na arte romana é marcante. Esculturas, mosaicos e afrescos o retratam como um homem maduro, barbado, de semblante sério e postura imponente, envolto em mantos escuros. O rapto de Prosérpina é um tema recorrente, sendo a célebre escultura barroca de Gian Lorenzo Bernini um exemplo sublime da intensidade dramática do mito.

Na literatura, Plutão figura em obras imortais. Virgílio, em sua "Eneida", descreve a descida de Eneias ao submundo para consultar seu pai Anquises. Ovídio, em suas "Metamorfoses", detalha minuciosamente o mito de Prosérpina. Essas representações literárias solidificaram a imagem de Plutão como o temível, porém justo, soberano do mundo dos mortos.

Um Legado Além da Escuridão

Plutão, o soberano do submundo romano, é muito mais do que a personificação da morte. Sua figura está intrinsecamente ligada aos ciclos da natureza, à riqueza da terra e à própria ordem cósmica. Ele é o guardião das riquezas escondidas e um pilar fundamental no equilíbrio do universo. A complexidade de seu caráter, que une o temor da morte à promessa da fertilidade e da justiça, reflete a profunda visão romana sobre a vida, a morte e o destino humano.

Compreender Plutão não é apenas estudar uma divindade sombria; é mergulhar nas crenças e valores de uma das maiores civilizações da história, revelando que, mesmo nas profundezas do submundo, há um soberano que detém o poder sobre a vida, a morte e a própria riqueza do mundo.


Por Albino Monteiro