Belona: A Deusa Selvagem que Incendiava os Campos de Batalha Romanos
Belona: A Deusa Selvagem que Incendiava os Campos de Batalha Romanos
Em Roma, quando a trombeta da guerra soava, todos os olhos se voltavam para Marte, o patrono dos exércitos, o estrategista supremo. Contudo, havia uma outra divindade que, nos bastidores da estratégia, encarnava a própria fúria, a destruição e o frenesi incontrolável do combate: Belona. De origens que se perdem entre os etruscos e sabinos, Belona (do latim Bellona, nascida de bellum, "guerra") nunca foi uma figura secundária. Ela era a personificação da violência e da ferocidade intrínsecas aos conflitos, um aspecto absolutamente crucial para uma civilização que forjou seu vasto império no calor da conquista militar.
A Companheira de Marte: Onde a Estratégia Encontra a Carnificina
Belona é frequentemente imaginada como a companheira, irmã, ou até mesmo esposa de Marte. Juntos, eles formavam uma dupla inseparável e aterrorizante nos campos de batalha. Enquanto Marte liderava as legiões com táticas e disciplina, Belona inspirava a carnificina e o desejo insaciável de aniquilação nos corações dos combatentes. Ela não representava a guerra justa ou a estratégia calculada de uma Minerva; a essência de Belona era o aspecto mais selvagem, implacável e voraz do conflito.
Sua imagem era tanto marcante quanto intimidatória. Belona é retratada como uma figura poderosa, envolta em uma armadura completa, um capacete de guerra (às vezes adornado com asas), e empunhando uma espada, uma lança e, notavelmente, uma tocha. Esta tocha não era um mero adereço; ela simbolizava a destruição e o fogo que consumia as cidades inimigas. Seu olhar penetrante e sua postura bélica refletiam a natureza indomável da guerra em seu estado mais puro.
O Culto do Sangue: Belona e o Coração do Estado Romano
Mesmo sendo uma divindade tão temível, Belona era fervorosamente venerada e invocada pelos romanos antes de qualquer campanha militar. Soldados e generais suplicavam por sua proteção e orientação, buscando garantir o favor divino e o sucesso em suas empreitadas sangrentas.
Um dos epicentros de seu culto era o Templo de Belona, estrategicamente localizado no Campo de Marte, em Roma. Este não era um templo qualquer; sua localização, fora do pomerium (o limite sagrado da cidade), era de imensa importância política e militar. Era ali que o Senado Romano realizava todas as suas reuniões relacionadas à guerra externa. Diplomatas estrangeiros, antes de pisarem na cidade, eram recebidos no Templo de Belona para negociar tratados, simbolicamente sob o olhar vigilante da deusa da guerra, que personificava o poder militar de Roma.
Os sacerdotes de Belona, conhecidos como belonários, eram figuras de respeito e temor. Em rituais específicos, como o Dies Sanguinis ("Dia do Sangue"), celebrado anualmente em 24 de março, eles realizavam oferendas e, por vezes, participavam de atos de auto-flagelação ou ofereciam seu próprio sangue à deusa, em um fervoroso apelo por vitórias e em uma sombria profecia de derrotas. Um dos rituais mais impressionantes para a declaração de guerra envolvia o lançamento de uma lança ritualística em um campo simbólico próximo ao templo, um gesto definitivo que sinalizava o início formal do conflito.
A Marca Indelével de Belona: Na Arte, no Idioma e na Alma Romana
A figura de Belona não se confinou aos campos de batalha ou aos ritos sagrados; ela transcendeu para se firmar profundamente na arte e na literatura romana. Ela aparece em esculturas, mosaicos vibrantes e afrescos, frequentemente retratada conduzindo uma carruagem ou percorrendo os campos de batalha com um chicote ensanguentado, encarnando o desespero e a inevitabilidade da guerra.
Belona representava a necessidade da guerra para a manutenção da ordem e da segurança na cultura romana. Ela simbolizava uma força feminina feroz no contexto militar, desafiando estereótipos e mostrando que o poder e a coragem não eram exclusividade das divindades masculinas. Seu nome, inclusive, é a raiz de termos como "bélico", "belicoso" e "beligerante" em diversas línguas latinas, um testamento de sua marca indelével na linguagem e na história.
Embora o fervor de seu culto pudesse ter flutuado ao longo das eras, Belona permaneceu uma figura poderosíssima no imaginário romano. Ela era a lembrança constante do custo emocional e físico da guerra, mas também da determinação e ferocidade inegáveis necessárias para a conquista e a manutenção do vasto Império Romano. Belona era a personificação da guerra em sua forma mais crua, um elemento vital e inerente à psique de um povo guerreiro.
Por Albino Monteiro
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